Ok. Eu estava com uma amiga de Priscilla (mas sem ela).
De noite.
Tarde da noite, mais especificamente.
E tinham outras pessoas com a gente, mas não lembro quem eram.
Só lembro que num minuto estávamos na rua dando risadas… e no outro, eu estava batendo em Priscilla.
Não foi um soco no olho pra deixar a cara roxa e inchada.
Mas foi um chute violento que acertou a perna dela em cheio.
Eu estava muito bêbado?
Não.
Nem bebo.
Mas vou contar toda a história e você vai entender.
Bem, lá estava eu, Elis (a amiga de Priscilla) e alguns estranhos, em plena madrugada se divertindo.
Era uma daquelas ruas cheias de barzinhos.
Apesar do horário, tinha um formigueiro de pessoas conversando e dançando ao som das 6 músicas diferentes que tocavam ao mesmo tempo nos bares.
Até que ouvimos um grito agonizante.
Logo em seguida, outro.
E vários urros de pavor vinham de uma rua lateral.
Como idiotas, nós caminhamos até a esquina pra ver o que aconteceu.
Parecia cena de filme.
Assim que botamos a cara, um grupo de pessoas passou pela gente como uma manada de antílopes fugindo de leões.
Mas ao invés dos leões, elas estavam sendo caçadas por outras pessoas.
Os “caçadores” corriam de maneira desconcertada e alguns estavam cobertos de sangue.
Quando vi aquilo, agarrei a amiga de Priscilla pelo braço e corremos pra uma direção que ninguém estava indo.
Nos perdemos do restante do grupo mas continuamos correndo.
O carro estava pro outro lado, na direção da carnificina.
“Venha, vamos achar um lugar pra se esconder” Eu disse a Elis.
Era madrugada e as ruas estavam vazias. Só dava pra ouvir nossos passos e nossa respiração pesada.
Até que dobramos uma esquina e dos deparamos com outras pessoas na rua.
Por um segundo fomos atingidos por uma sensação de segurança. Minha mente já pensava em pedir um telefone emprestado e ligar pra alguém que pudesse chegar mais rápido e nos tirar daquela loucura.
Mas a expressão de alívio em nossos rostos logo se transformou em angústia de novo.
Quando me aproximei, percebi que as pessoas na rua andavam de maneira desconcertada, igual àquelas que vimos “caçando” os outros nos bares.
Puxei Elis pelo braço e fiz o gesto de silêncio pra ela.
“shhhhhhhhh”
Atravessamos a rua agachados pra não sermos notados mas de novo, como nos filmes, assim que estávamos quase do outro lado, eu tropecei numa latinha de cerveja que fez todos os esquisitões da rua olharem pra gente.
Elis espremeu minha mão. Dava pra ver o medo da morte em seus olhos.
“Corre, corre, corre!” Saí puxando ela (que por sorte é magrinha, ágil e corre muito).
Agora, nós éramos a caça.
Os destrambelhados corriam alucinados atrás da gente, com olhos brancos e as mandíbulas se mexendo, mas sem dizer nada.
“Socooooorrro. Socooooooorro.” Elis gritava por onde passávamos mas ninguém abria a porta pra gente.
“Não adianta. É só eu e você agora.” disse pra ela. “Por aqui, vem vem vem”.
Entramos no que parecia um pátio imenso de um loja de material de construção.
A sorte é que, mesmo em momentos assim, minha mente consegue pensar rápido. Na hora eu imaginei que poderíamos tanto nos esconder lá, quanto encontrar algumas coisas pra nos defender como facões, machados, pé de cabra, enfim.
Mas era um galpão imenso de metal, com portas reforçadas e sem janelas à nossa altura.
Não dava tempo pra procurar uma maneira de entrar. Os descontrolados ainda estavam atrás da gente.
Olhei ao redor e vi que estávamos no estacionamento. Avistei um portão aberto ao fundo que dava pra outra rua.
“Tive uma ideia. Venha.”
“Não consigo mais correr. Minhas pernas estão sem força.” Ella desabafou.
“Só até aquele portão. Confie em mim”
Falei com tanta segurança que ela continuou correndo. Mas a verdade é que eu não fazia a mínima ideia se iria dar certo.
Meu plano era passar pelo portão e fechá-lo pra deixar os bichos presos lá dentro.
Mas será que dava pra fechar aquilo? E rápido??
Chegamos no portão e graças a Deus, era daqueles corrediços (e estava lubrificado).
“Elis, me ajude aqui” Empurramos e fechamos o portão. Não tinha cadeado mas consegui passar um ferrolho.
Nos afastamos e ela desabou no chão, exausta e buscando ar pros pulmões.
As criaturas vieram em frenesi como se não houvesse nada entre nós. Eles se chocaram com tanta violência nas grades, que dava pra ouvir o som oco de seus crânios atingindo o metal.
O portão inteiro tremeu.
“Vamos. Temos que continuar. Não sei quanto tempo isso vai segurar aquelas coisas”
Continuamos. Andando a passos largos.
“Ali, um banco 24h” Elis apontou. “Acho que dá pra se esconder no banheiro”
Atravessamos a rua com cuidado e a porta de vidro estava aberta. E tinha de fato um banheiro no bendito banco.
Quando entramos, tinha mijo por todo o chão e uma pilha de papel higiênico usado no canto.
Podre.
Ela deu teve contração de vômito mas eu a virei pro outro lado. “Segure a onda aí. É isso ou aquelas coisas lá fora.”
“O que a gente faz? O que tá acontecendo, Bruno??” Elis me perguntava tremendo, com lágrimas no rosto.
“Eu não sei. Mas vamos sair dessa”
Foi só fechar a boca pra alguém bater na porta do banheiro com violência.
POW!
“NÃÃÃÃÃÃOOO. SAI DAQUI” Elis gritava em pânico “São eles. São Eles!”
Era uma daquelas portas finas de compensado ou sei lá o quê. Na primeira pancada já rachou. Eu sabia que era só questão de tempo até eles quebrarem.
“Socooooooro! AlguÉÉÉÉÉMMM” Ela gritava.
Olhei em volta do pequeno banheiro e vi uma pequena janela de ventilação.
“Elis, acho que você passa ali”
POW… POW… POW… as criaturas continuavam esbarrando na porta.
Subi na pia, quebrei o vidro com minha mão e olhei pela janelinha.
Dava pra dentro do banco. Estava tudo escuro mas aparentemente vazio.
“Venha, eu lhe ajudo.” Ela subiu na pia, pisou em minha coxa e se espremeu pelo buraco.
Assim que caiu do outro lado, vi uma criatura se aproximando dela.
“Tem um atrás de você, CORRE”
Ela adentrou no vão escuro, e pareceu ter despistado a coisa.
Não podia deixá-la sozinha e a porta não ia durar muito, então tentei passar pela janelinha.
Mas quando dei um impulso, a pia quebrou abaixo de mim.
Caí de cara mijo.
Me levantei, encostei na parede e olhei pra porta. O desgraçado conseguiu fazer um buraco e enfiou o braço pra tentar me alcançar.
Fechei os olhos e só conseguia pensar “vou morrer. vou morrer. vou morrer”.
“não vou morrer. Não aqui”
De repente fui tomado pela coragem. Abri os olhos, olhei pro bicho e gritei:
“EU NÃO VOU MORRER AQUI”
A criatura já tinha passado metade do corpo pela porta. Era vida ou morte.
Cerrei os dentes, corri até ele e dei um chute frontal com todas as forças que eu tinha.
Que tipo de de chute?
Desse aqui:
O zumbi voou pra trás e caiu em cima dos outros…
…Ao mesmo tempo em que acordei e percebi que, na verdade, estava deitado na cama e acabei de chutar Priscilla.
Levantei assustado e alisando a perna dela.
Mas parece que ela não acordou??
Ufa.. o chute foi só no sonho mesmo.
Aí ela virou pra mim e disse:
“Tava sonhando com o que pra me dar um chute desses?”
Olhei pra ela e:
“HahAhAhAhahhahHah”
Eu ria tanto que não conseguia nem contar a ela o que aconteceu.
E acredite ou não, eu só pensava que isso daria um belo email 🙂
Ai ai…
Pior que ela acabou de sair de casa. Disse que vai ter reunião.
Só me resta torcer pra que nem ela, nem você, me denuncie pela Maria da Penha.